segunda-feira, 30 de junho de 2014

FILME: O PORTEIRO DA NOITE - 1974


Direção: Liliana Cavani - 1974
Duração: 117 min
Título original: Il portieri di notte 

Um filme que pode ser polêmico uma vez que trata de um oficial nazista que se esconde em Viena trabalhando como porteiro de um hotel e uma judia que foi presa no campo de concentração e torturada por ele. Não se trata aqui do bem e do mal, em colocar o nazista como um mostro e que deve pagar pelo o que fez e a judia vítima, mas sim, justamente quando a vítima se identifica ao agressor e o introjeta mantendo com ele uma relação de gozo, mesmo que na dor, e o agressor também participa deste gozo.

Lucia Atherton (Charllote Rampling) é uma sobrevivente de um campo de concentração, casada com um maestro que vai se apresentar em Viena. É o ano de 1957, portanto doze anos após o fim da guerra, e ela o acompanha. Maximilian Theo Aldorfer (Dirk Bogarde)  é o oficial nazista que foi seu torturador e se esconde como porteiro de hotel. Os olhares se cruzam no instante em que ela o vê. Um olhar que diz muito, que marca, que revive, um traço. Aquele olhar que a viu, bem mais jovem, uma garota, nua.

Ela vai se recordando de cenas do que ocorreu no campo. Como ela poderia se negar a fazer o que ele queria? para sobreviver ela tinha que lhe obedecer, mas se a um tempo ele a torturava, a outro ele era gentil, gerando uma relação de amor-ódio. Ele um oficial, mais velho do que ela, com poder de vida e morte sobre ela.

Max também se envolveu nesta relação, ela a chama de "minha garotinha", e saiu de seu lugar de SS onde deveria torturar e matar para gozar esta relação sadomasoquista e "proteger" esta garotinha.

Além do olhar de Max ,ela está nua no campo, seu olhar a desvela, mas ele também a veste, como a uma criança, há os toques, o beijo em seu ferimento, o ato de lhe dar de comer na boca como se fosse uma criança. A vítima do abuso, do agressor sente o prazer que lhe vem dos toques originários, do olhar da mãe, e os confunde com o prazer que poderia ter numa relação normal com outro homem. Ela passa a precisar deste prazer, não de uma forma saudável, não é o desejo, é o gozo. Não se trata aqui de um prazer consentido, é algo que se rememora no corpo.

Ao se reencontrarem passam a reviver tudo isto de uma forma doentia e Lucia deixa o marido para gozar nesta dor que lhe dá prazer. Não poderia terminar bem isto. Na relação atual chega-se ao ponto de ambos serem vítimas, eles se trancam no apartamento de Max para se protegerem do grupo de nazistas que os persegue, acabam como no campo, com fome e sede. Só que bastaria ligar para a polícia, mas ninguém faz isto. Nem ele para salvá-la, nem ela para se salvar. Acabam não aguentando mais, se vestem como antes, ele com seu uniforme da SS e ela com um vestido de garota, como o que ele usou para cobri-la no campo e saem, são seguidos e mortos.

Ao olharmos o filme nos inquietamos, nos questionamos o que leva à isto? por que ela não o entrega? não o acusa? de onde esta impossibilidade? E ele? por que não faz o que o grupo ao qual pertence que elimina as testemunhas vivas costuma fazer: arquivar as testemunhas? ou seja, matá-las?

Liliana Cavani nasceu em 1993 em Carpi, Itália. Cavani realizou este filme para tentar compreender, reprojetar a relação de seus pais, sendo que o pai era facista e a mãe judia. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário