sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

LIVRO: EM BUSCA DE SENTIDO - VIKTOR FRANKL



Frankl, Viktor. Editora Vozes, 2009
Publicação: 1946
Tradução: Walter Schlupp e Carlos Aveline
186 páginas
Título Original: Ein Psycholog erlebt das kozentrationslager

Neste livro o psiquiatra Viktor Frankl fala que aquele que passou por uma experiência traumática sabe compreendê-la de uma forma que aquele que não passou não consegue, apesar de não possuir o distanciamento exigido pela ciência e de que ocorrem distorções.

Em função de sua experiência e vivência em campos de concentração na segunda guerra ele questiona o que mantém o ser humano vivo, o que o faz viver? e costuma perguntar a seus pacientes que passam por sofrimentos difíceis por que ele não opta pelo suicídio?

O livro descreve o método psicoterapeuta de Frankl para encontrar uma razão para viver. Na primeira parte ele fala de suas experiências no campo de concentração e na segunda introduz a logoterapia.

Ele vai desviar de Freud e a sexualidade, apesar de sua admiração por ele, e penso que o faça pois viveu algo onde a sexualidade quase que desaparece, não havia nada sexual nos campos como acontece nos quartéis, com soldados em guerra, ou qualquer outra situação de reclusão ou aglomeração. Talvez seja o único lugar onde o sexo não pode diminuir a morte. Não há onde colocar uma libido. Mas há porém uma pulsão de vida que ainda prevalece nos que conseguem sobreviver a tudo que enfrentam.

Quando vivemos momentos que nos colocam diante da morte o sexo e a comida são formas de lidar com isto, mas nos campos justamente nem uma coisa nem outra, então eles sonhavam com comida e ao acordar enfrentavam o horror da realidade. Então Frankl questiona isto, o que mantém o ser humano vivo, sem a pulsão sexual e agressiva, onde ele busca forças? Quando a fome devora o próprio corpo transformando-o num esqueleto, quando o frio congela os dedos que caem ou são retirados com uma pinça? quantos aguentaram e como? por que? O que salvou os sobreviventes? Podiam se suicidar nas cercas elétricas como  muitos fizeram.

São estas perguntas e respostas que Frankl busca, o sentido para viver, o por que viver?

Mas eu me pergunto até que ponto isto é possível? sobreviver sim, continuar vivo sim, e realmente deve haver algo muito poderoso que permite isto em face a tamanhas atrocidades e dores, fome, frio e doenças, mas será que o psiquismo consegue elaborar todos estes traumas? como ficou o psiquismo dos que sobreviveram? Muitos se suicidaram depois, outros escrevem para tentar exorcizar.

Muitos não aguentaram não serem ouvidos, ninguém queria saber de tudo isto, principalmente depois da guerra, queriam comemorar, viver, foi uma época de gozo da vida. Quantos sobreviventes não se sentiram párias? um excluído? Muitos se casaram entre si, logo após a libertação e seguiram com a vida, mas a herança psíquica está nos filhos e quantas gerações serão necessárias para que isto desapareça?

No campo de concentração todos estavam na mesma situação, mas depois da libertação, enfrentar o olhar de nojo, pena do outro? ao invés de ser visto como um herói, que conseguiu sobreviver?

O que Viktor Frankl nos mostra é como buscar um sentido para a vida quando se passa pelo extremo da dor e da humilhação. Não penso que todos sejam capazes, mas para aqueles que conseguiram achar um sentido, aqueles que se dedicaram também ao outro no meio de tudo isto dando um sentido a si próprio no meio de tudo, é possível. O que te faz viver? um filho? um desejo que você acredita realizar? um sonho? as recordações que te sustentam?

Não é fácil quando se vive o que viveram os presos de campos de concentração, mas vários conseguiram não morrer ali. E não foi apenas a sorte, de não ser escolhido na seleção para a morte, muitos nem foram para as câmaras de gás, morreram antes ou se mataram.

Viktor transformou o maior sofrimento de sua vida, inimaginável para quem não o viveu, na logoterapia, transformou o trauma em algo que pode ajudar muitas pessoas, e isto sim, eu acredito seja uma forma de curar um trauma, transformá-lo em algo.


Viktor Frankl nasceu em 1905 em Viena, Áustria e faleceu em em 1997 com 92 anos na mesma cidade. Fundador da logoterapia que explora o sentido existencial do ser humano. Ficou preso nos campos de concentração por 13 anos, perdeu seus pais, seu irmão e sua esposa grávida mortos pelos nazistas.

Assista a entrevista com Viktor Frankl para saber mais:


LIVRO: QUANDO ÉRAMOS ÓRFÃOS - KAZUO ISHIGURO


Ishiguro, Kazuo. Companhia das Letras, 2000
Tradução: José Marcos Macedo
393 páginas
Título Original: When we were orphans

A história é narrada por Christopher Banks quando se encontra na Inglaterra pós-guerra em retrospectiva sobre sua vida. Ele é um famoso detetive que desvendou vários casos que ficaram famosos, porém o mais importante para ele,o desaparecimento de seus pais em Xangai antes da Segunda Guerra, ele foi procrastinando até finalmente tomar a decisão de voltar e resolver também este caso.

A maior parte da narrativa é em Xangai, iniciando com as recordações de Christopher sobre sua infância na Colônia Internacional onde vivia e sua amizade com Akira, um garoto japonês que era seu vizinho. Quando seu pai desapareceu misteriosamente ambos brincavam de ser o inspetor Kung, o responsável pela investigação, e resolviam o mistério. O que não se esperava é que sua mãe também desapareceria.

Após o desaparecimento de seus pais Christopher é levado para a Inglaterra e criado por sua tia.

A força dos registros da infância transparecem o tempo todo no livro. Primeiro Christopher escolhe como profissão ser detetive, mas reluta em ir atrás do mais importante para ele até que finalmente o faz. Volta à Xangai e começa a investigar e é neste momento que todo o trauma da perda de seus pais passa a atuar.

Xangai está cercada pelos japoneses, e quando ele encontra um soldado japonês ferido nos escombros do cortiço onde imagina estarem seus pais ele vê nele Akira. O soldado percebendo que seria sua chance de sobreviver e não ser morto pelos chineses entra no jogo e o leva até onde ele quer ir, a casa indicada pelo inspetor Kung como sendo a única que ele não revistou na época do desaparecimento de seus pais, porém ela está destruída também.

Xangai no tempo de sua infância era dominada pelo comércio do ópio, e sua mãe e o chamado Tio Philip, eram contra isto, e faziam campanha para acabar com o tráfico. Agora Christopher quer se encontrar com o Cobra amarela, que supõe saber o paradeiro de seus pais. Ao final ele terá grandes surpresas quando descobrir finalmente o que aconteceu.

Por mais que Christopher fosse um renomado e excelente detetive quando se trata de si próprio a coisa já não é tão simples, lhe falta objetividade e distanciamento, ele é envolvido em suas emoções e memórias que nem sempre são exatas, se fixam no tempo, faltam pedaços e são registradas segundo a ótica de uma criança, o que lhe dificulta enxergar a realidade do que investiga. Ele parece voltar no tempo quando brincava com Akira de detetive, ignora inclusive que o japonês está seriamente ferido, não percebe que não é Akira, uma vez que em sua mente ele teria que resolver o mistério junto com seu amigo, só assim o conseguiria.

Além da questão do ópio e do poder, o livro passa levemente pela questão dos costumes, e do amor patológico, onde um ego ferido é capaz de vingança.

Quando carregamos um trauma de infância, acabamos passando a vida dirigindo nossas energias psíquicas para isto, na tentativa de solucionar revivemos e buscamos a resposta, como os órfãos de pais desaparecidos, um vazio que se cria. Christopher e Jennifer, a criança que perdeu seus pais e ele adota, retribuindo à vida o que sua tia fez por ele,  passam a vida tentando compreender, e ao fim o que buscam é a paz, o viver um pouco e com pequenos prazeres possíveis.

Kazuo Ishiguro nasceu em 1954 em Nagasaki no Japão, mas emigrou com sua família para a Inglaterra quando tinha seis anos.


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

FILME: FLORES DE AÇO - 1989



Direção: Herbert Ross - 1989 
Duração: 104 min 
Título original: Steel Magnolias 
Roteiro: Robert Harling
País: Estados Unidos 

Seis mulheres que são amigas e suas dificuldades, dores, alegrias, dúvidas, se apoiam mutuamente e formam um grupo ímpar.



Shelby (Julia Roberts) vai se casar, mas ela é diabética e não pode ter filhos. Sua mãe M'Lynn (Sally Field) está atarefada com todos os preparativos e também preocupada com o fato dela não poder ter filhos reforçando isto para eles, mas Shelby acabara engravidando e levará isto adiante.
Todas acabam indo ao salão de Truvy (Dolly Parton) para se arrumarem para o casamento, mas isto já faz parte de sua rotina também, esta ida ao cabeleireiro. Para ajudá-la Truvy acaba de contratar Annelle (Daryl Hannah) que acaba de chegar ao lugar e não é conhecida de ninguém. Ouiser (Shirley MacLaine) é a mais rabugenta de todas, com seu cachorro seu maior prazer é atormentar o marido de M'Lynn, e tem também Clairee (Olympia Dukakis). 

O enredo gira mais em torno de Shelby e sua dominadora mãe M'Lynn que não está acostumada a ser contrariada, mas no momento mais difícil ela será amparada por suas amigas.

Nada supera a lealdade que une estas seis mulheres seja nas alegrias ou nas piores horas. Um filme sobre a amizade, e com um elenco único trabalhando juntas.


Herbert Ross nasceu em 1927 no Brooklyn, New York e faleceu em 2001 na mesma cidade. 

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

FILME: A JOVEM RAINHA VITÓRIA - 2009


Direção: Jean-Marc Vallée - 2009
Duração: 105 min 
Título original: The young Victoria 
País: Reino Unido 

Ganhou o Oscar de melhor figurino. 

Sobre o início do reinado da Rainha Vitória, quando casou-se com seu grande amor Albert. Ele morreu  jovem com 42 anos de tifo. Vitória se fechou e manteve o luto até morrer aos 81 anos.



Vitória (Emily Blunt) é jovem, sua mãe (Miranda Richardson) é dominadora e tem um companheiro John Conroy (Mark Strong) que teme que ela ao atingir a maioridade o afaste do poder, mas Vitória se recusa a entregar a regência à sua mãe quando seu tio Willian IV está morrendo.



Muitos interesses estão em jogo e há vários pretendentes à sua mão, e um deles é Albert (Rupert Friend), príncipe da Bélgica, que vai até a Inglaterra a pedido de seu tio. Também é cortejada pelo primeiro ministro Lorde Melbourne (Paul Bettany), mas acabara se casando com seu grande amor Albert e formarão um belo casal apaixonado. Porém Vitória foi criada para obedecer, e quando é coroada assumirá o trono e também a autonomia, mas por não ter preparo para isto cometerá alguns erros que a farão ser mal vista. Seu marido é mais sábio do que ela, mas ela relutará em escutá-lo por temer que esteja agindo em prol de seu tio, o que não ocorre, pois ele por amor a ela não se tornou o elo entre seu tio e a Inglaterra.



As intrigas, os medos, o poder, mas sobretudo o amor que une Vitória e Albert, que é lendário devido ao luto que ela assumiu e nunca deixou.


Jean-Marc Vallée nasceu em 1963 em Montreal, Canadá.

Trilha Sonora - IIan Eshkeri 

FILME: O LOBO DA ESTEPE - 1974


Direção: Fred Haines - 1974 
Duração: 108 min 
Título original: Steppenwolf 

Adapatação do livro O Lobo da Estepe de Hermann Hess

Um filme estranho, surreal, sensações estranhas ao vê-lo, mas retrata a dualidade, a fragmentação de Harry Haller (Max Von Sydow) que é ainda maior que dois lados.É literalmente um mergulho em si mesmo.

A questão é o lado doméstico e o lado selvagem e como os que o percebem sofrem com ele. Somos seres sociais, civilizados, mas temos um lobo dentro de nós que arreganha os dentes. Mas o mais difícil do que controlar este lobo com seus dentes afiados no social é lutar com ele dentro de nós. Queremos ser aceitos, amados, mas o lobo age para que isto não aconteça, porém por outro lado ele quer preservar o que somos e desejamos. E o conflito é que ao sermos bonzinhos nos odiamos, buscando ser amado pelo outro, mas se rosnamos também nos odiamos, porque o outro não gosta e não somos amados. E ao perceber isto geralmente a pessoa se torna um solitário, um lobo da estepe.

Uma crítica ao mundo burguês, ao socialmente aceito, Harry um intelectual de família burguesa não aceita tudo isto, e parte em busca de si mesmo, mesmo que para isto precise fazer uma viagem muito louca.

Veja um trecho:



Fred Haines nasceu em 1936 em Los Angeles, EUA e faleceu em 2008. 

FILME: BORDERLINE - Além dos limites - 2008



Direção: Lyne Charlebois - 2008 
Duração: 110 min
Título Original: Borderline 

Adaptação dos livros Borderline e La Brèche de Marie-Sissi Labrèche

Quando se carrega um excesso em si qual a saída? Kiki (Isabelle Blais) coloca seu excesso no sexo. O que ela quer é fugir da rejeição, não se sente amada, mas paradoxalmente, quando encontra um homem capaz de amá-la não sabe o que fazer, se perde, não sabe fazer amor. Não compreende, fica sem jeito e quando ela vê que ele preparou o café da manhã para eles ela foge.

Ansiosa, explode, treme, a única coisa estável em sua vida é seu cachorro - Claude Vidau. Escreve maravilhosamente bem, colocando na escrita a si mesma numa tentativa de compreender e expressar. Procura ajuda, a psicanalista, a terapia de grupo. É o excesso da sexualidade como pulsão que não tem destino e vai para o sexo.

Sua vida não foi fácil, uma infância com a mãe internada em um hospital psiquiátrico e sendo criada pela avó. Ela sente uma imensa angústia, quer se compreender mas não consegue. Vive no limite, no excesso, na borda, borderline, sem fronteiras.

É o caos, e não o suportamos, precisamos ter nossas fronteiras, mas quando o excesso transborda ele tem que ir para algum lugar, e Kiki o coloca no sexo que no filme é algo de segundo plano, tem que estar ali, mas não é isto que é o importante no filme, o sexo é apenas o lugar para onde foi o excesso.




Lyne Charlebois é uma cineasta canadense 

FILME: PARIS - 2008


Direção: Cédric Klapisch - 2008
Duração: 130 min 
País: França 

Pierre (Romain Duris) um jovem dançarino francês fica sabendo que tem um sério problema no coração, terá que fazer um transplante com 40% de chances de dar certo. Sua irmã Élise (Juliette Binoche) ao saber disto vem morar com ele e traz consigo seus filhos. Enquanto aguarda o transplante do qual não sabe se sairá vivo ele observa a rua e as outras pessoas, passa a viver a vida dos outros.



Estes outros são: dois irmãos que acabam de perder o pai. Um é arquiteto, casado, sua mulher está grávida, chora à qualquer emoção, o irmão é um renomado professor de história que pelo dinheiro acaba fazendo um programa popular de TV apresentando a cidade de Paris. Ele se apaixona por uma de suas alunas que tem uma beleza extraordinária sobre a qual ele acaba percebendo chegar a ser horrível, pois transforma as outras mulheres em banais. Ele acaba no psicanalista.

A dona de uma padaria chatérrima com os funcionários e agradabilíssima com os fregueses. Preconceituosa, racista, não só com os estrangeiros, mas também classifica os franceses em bretões, alsacianos ... e os parisienses.

A feira onde quatro amigos trabalham. Um acaba de se separar e sua ex-mulher também trabalha ali, é atraente e possui um narcisismo exacerbado, imune ao ciúme. Ele a demite de seu trabalho ali e ela tem um caso com um dos feirantes.

Um clandestino que tenta ir de Camarões para Paris numa travessia perigosa. Seu irmão e a mulher já estão lá. Eles passam pela assistência social onde trabalha Élise.

Para Pierre de sua janela nenhum deles tem problemas e pensa como seria bom poder ser assim, um deles. Olhar Paris com calma, receber uma carta. No caminho para o hospital no dia do transplante ele passa por cada um deles imaginando isto, sem saber que todos estavam passando por momentos dolorosos também, mas também de alegrias. Para cada um sua dor é a maior.

Quanto à morte, ele que a espera e sofre com isto, não ficamos sabendo se ele se salva ou não, mas no filme dois morrem, dois que pensavam ter 100% de chances de viver.

A vida é assim, a morte surge de repente, separações, acidentes, doenças acontecem, mas também alegrias, nascimentos, encontros. Não existe uma vida perfeita e os outros não estão melhores ou piores do que nós, podem estar num momento melhor, mas também terão seus desafios, medos, dores. Mas, ao saber que tinha 60% de chances de morrer Pierre passa a olhar o mundo com outros olhos.


Cédric Klapisch nasceu em 1961 em  Neuilly-Sur-Seine, França

Trilha sonora Wax Tailor 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

FILME: UMA PRIMAVERA COM MINHA MÃE - 2012


Direção: Stéphane Brizé - 2012
Duração: 108 min 
Título Original: Quelques heures de printemps 
País: França 


Após sair da prisão Alain (Vincente Lindon) com 48 anos se vê obrigado a voltar a viver com sua mãe (Hélène Vincent), o que será uma difícil convivência.

Ambos são teimosos e há coisas do passado que interferem, eles discutem muito, mas são calados em tudo mais. Alain é extremamente fechado, apesar de sua imensa carência de afeto e sua capacidade de dar carinho, desde que calado. Sua mãe está doente mas não fala nada, até que ele descobre que ela tem um câncer no cérebro.
Por causa das brigas ele sai de casa, vai morar no vizinho e será necessário que sua mãe se engane ao alimentar o cachorro - Calie - lhe dando veneno de rato ao invés da ração, para que os dois se falem novamente e socorram a cachorra.

Por trás disto tudo há um pai, um marido que foi agressivo, autoritário.

Seu câncer piora e ela opta pelo suicídio assistido o que na França é proibido, mas na Suíça é legal. Acertam todos os detalhes, e o filho a leva. O tempo todo reina o silêncio, e somente após ela tomar o remédio que causará sua morte, naqueles últimos segundos ela lhe dirá que o ama muito e ele consegue gemer um eu também.

Um filme que aborda a relação mãe e filho e o que causa o silêncio, a falta de diálogo e a questão da eutanásia, da morte assistida como uma escolha, o direito a ter uma morte sem dor, antes do corpo se deteriorar totalmente e causar sofrimento a todos como ocorre numa doença terminal. Ela foi até onde acreditou ser possível, quando seu quadro piorou e iria se iniciar o fim ela encerrou antes.


Stéphane Brizé nasceu em 1966 em Rennes, França. 

FILME: HANNAH ARENDT - 2012



Direção: Margarethe von Trotta - 2012
Duração: 113 min
Roteiro: Margarethe von Trotta e Pam Katz 
País: Alemanha - França 

Um filme sobre a filósofa política alemã de origem judaica Hannah Arendt

Hannah Arendt (Barbara Sukowa) já está nos Estados Unidos onde vive com seu marido Heinrich (Axel Milberg) por ocasião do Julgamento de Eichmann que ocorrerá em Jerusalém. Ela irá para cobrir o  mesmo pelo The New Yorker.

Sua análise do julgamento repercutiu muito mal, ela sofre ofensas, incompreensões e acusações por três anos. Ainda se estava muito próximo de tudo que aconteceu na Segunda Guerra com os judeus. Mas sua análise se por um lado assombrou o mundo, por outro é extremamente lúcida. A banalidade do mal não é por ser supérfluo, mas é pela mediocridade. Ela foi fria, ficou atenta aos fatos e à lei.



Eichmann cuidava da logística dos trens que levavam os judeus para os campos de concentração, mas ele sabia o que eram aqueles trens e qual o destino para seus ocupantes, e neste sentido o maquinista também é um criminoso.
Quando um líder agrega a massa, ela não pensa, irá agir conforme a massa, fará coisas que jamais faria sozinha, mas seguirá o grupo. Eichmann é um burocrata, obedece e faz seu trabalho bem feito. E a solução final está dentro da lei do Estado Nazista. É complicado isto. Ele não agiu ilegalmente dentro daquele Estado e dentro da lei que vigorava.
Isto não retira o hediondo, o crime de Eichmann, mas mostra como um cidadão comum, pai de família e um bom pai pode fazer o que ele fez. Se não houvesse o nazismo ele teria sido um funcionário exemplar e um bom marido e pai de família, jamais um criminoso. Ele não pensa, não avalia o que está fazendo.



Um dos pontos mais controversos é quando diz: "Toda a verdade é que , se o povo judeu tivesse sido verdadeiramente desorganizado, sem chefes, o caos teria reinado e muita miséria também, mas o número de vítimas não teria podido atingir entre quatro e meio e seis milhões."

O gueto de Varsóvia, os chefes judeus, que se por um lado conseguiam coisas como comida, por outro escolhiam quem ia ser deportado e os convenciam que iam trabalhar. E os outros confiavam neles. Ao final a maioria foi eliminada, mas alguns escaparam e estavam em postos políticos quando Arendt publicou seu livro. Somente quando começaram a surgir os relatos dos sobreviventes isto foi ficando mais claro.

Eichamnn é culpado por ter obedecido sem pensar, o que não lhe traz  culpa no seu entender, ele fez o que tinha que fazer e obedecer é uma virtude, para os alienados é. Porém existe a maldade, está no ser humano. Não se trata como diz Platão que o mal só existe porque não se conhece o bem, não se sabe o bem, e aprendendo o bem se elimina o mal.

A questão é quando se acredita que eliminar os outros é o bem.

Arendt não defendia Eichamnn, ela queria compreender, mas isto não o absolve de seus crimes.

O filme retrata um pouco de sua vida, de sua relação com Heidegger, seu marido, alguns amigos. Era judia, foi para um campo de concentração na França e conseguiu ir para os Estados Unidos. Sua clareza na compreensão de como alguém pode agir da forma mais monstruosa e não acreditar nisto, e ainda acreditar que fez o correto, e também por ter levantado que entre os judeus houve pessoas que colaboraram, lhe valeu a perda de amizades inclusive de pessoas que ela amava muito, além de todas as acusações que sofreu.

Atualmente já se faz outra leitura de sua análise e do seu livro. E ele é válido não apenas para os nazistas, mas para compreender como é possível que o ser humano possa agir de uma forma tão cruel e ser um assassino para uns e para outros ser uma excelente pessoa e continuar acreditando que agiu certo.


Margarethe von Trotta nasceu em 1942, em Berlin, Alemanha. Atualmente mora em Paris.

FILME - MINHAS VIDAS - 1986




Direção: Robert Butler - 1986 
Duração: 235 min 
Título Original: Out on a limb 

Baseado no livro Minhas Vidas de Shirley MacLaine que também é a protagonista do filme. 

Trata-se de um filme espiritualista.

Já li o livro há muitos anos atrás e agora assisti ao filme. Shirley está num momento de questionar sua vida, seus amores, principalmente o que ela vive no momento com um importante político casado.

É o relato de uma longa jornada que ela empreendeu para dar um sentido à sua vida. Ela sentia falta de algo, apesar de todo sucesso que fazia. É o relato de sua jornada espiritual onde nos falará de reencarnação, médiuns, vidas passadas, suas experiências, o que viveu e sentiu. Fará uma viagem ao Peru onde passará por momentos especiais.

Uma busca de si mesma através da espiritualidade, da matéria espírito.

"Não temos uma alma, nós somos uma alma"


Robert Butler nasceu em 1927 em Los Angeles, Califórnia, EUA 

FILME: COMER REZAR AMAR - 2010



Direção: Ryan Murphy - 2010 
Duração: 133 min 
Título original: Eat Praty Love 
Roteiro: Ryan Murphy e Jennifer Salt
País: Estados Unidos 

Baseado no livro autobiográfico Comer Amar Rezar de Elizabeth Gilbert 

Elizabeth (Julia Roberts) encontra dificuldades em seus relacionamentos, seu casamento termina, e ela percebe que algo nela mesma não vai bem até o dia em que abandona tudo e resolve viajar para a Itália, Índia e Bali para se dar um tempo e viver algo diferente.

Eu também li o livro, mais um que comprei no aeroporto para passar meu tempo na sala de espera. Nestes momentos gosto de um livro mais leve, divertido mas que também me ensine algo, e este foi um destes.

A Itália, lugar de comer. A busca da pulsão da vida, do prazer, o prazer de comer sem culpa. E há melhor lugar para o prazer do que a Itália? um lugar belíssimo, arte, experiências estéticas, música alegre e dançar, falar e claro, comer! Um prazer que é diferente de diversão, de entretenimento. Na Itália se fala com a boca, mas também com gestos, muitos gestos, o que leva a pessoa a se soltar e se expressar com maior vivacidade.



A Índia - Rezar. Ou um lugar espiritual, para encontrar a paz, a serenidade. Elizabeth quer meditar, não é fácil, mas ela insiste. O encontro de si mesmo e perceber que só você mesmo pode fazer algo por si. É a hora de curar as feridas, as dores.



Indonésia - Bali. O amor. É quando conhece Felipe (Javier Bardem) que também passou por momentos difíceis em seu relacionamento. O encontro destes dois possibilitará o encontro com o amor.



Apesar de nos carregarmos junto para onde que vamos, lugares novos sempre propiciam novas experiências, pessoas novas, outros olhares, outros cenários, cheiros, sons, comidas, a língua. Vemos coisas inusitadas outras parecidas, estranhamos e nos encantamos, também nos chocamos. Viver algo diferente pode ser mais construtivo do que uma terapia, e no filme é esta a escolha de Liz, terapia ou viver algo novo? Ela opta pela segunda opção. Não é uma fuga, a dor vai junto, mas ela pode se transformar neste processo.


Ryan Murphy nasceu em 1965 em Indianápolis, Indiana, EUA.

Trilha sonora de Dario Marianelli 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

FILME: VULCÃO - "ELDFJAL" - 2011



Direção: Runar Runarsson - 2011
Duração: 95 min 
Título original: Eldfjal 
País: Islândia 

Hannes (Theódór Júlíusson)  é um homem de 67 anos de idade, o filme começa com o último dia dele em seu trabalho na escola, ele está se aposentando. Quando sai da escola para o carro, tenta se suicidar mas desiste. Ele é ranzinza, reclama de tudo em casa, mas a dor em seu rosto nos toca. Enfrentar a velhice que se aproxima, perder seu lugar no trabalho que o constituía, ficar sem rumo e se sentir inútil. Ele não encara bem a entrada nesta fase de sua vida.



Seus filhos não o compreendem e o criticam. Um dia ele ouve uma conversa entre eles que falam sobre ele e sua mãe, e então se dá conta de como age e resolve mudar. Compra os ingredientes para o prato preferido dela, há uma linda cena de sexo entre os dois e então na hora do jantar ela sofre um AVC que foi muito grave, não consegue mais falar e apenas chora e geme.



Como no filme Amor Hannes resolve cuidar ele mesmo de sua esposa e os filhos acham isto um absurdo. Ele assume isto e também começa a se aproximar do neto, chama-o para ajudar a consertar o seu barco e o menino leva uma bronca do pai por estar se sujando.

Todos tem pena da mãe, antes era porque ela aguentava o pai, depois porque ela está num estado vegetativo, mas ninguém percebe a dor e a solidão de Hannes que é quem acaba fazendo algo para mudar.

Ele fica olhando slides com fotos do tempo que eram jovens, e ainda moravam na ilha do vulcão. Mudaram-se de lá após sua última erupção. Era uma mulher vibrante, viva e muito bonita, um belo sorriso, neste momento ela geme no quarto e ele se decide. A sufoca com o travesseiro e depois deita-se ao seu lado e chora muito.



Um filme triste mas belo.


Runar Runarsson nasceu em 1977 em Reykjavík na Islândia. 

DOCUMENTÁRIO: JOSÉ E PILAR - 2010


Direção: Miguel Gonçalves Mendes - 2010 
Duração: 125 min 
País: Espanha - Portugal - Brasil 

Mendes realizou o filme sobre José Saramago e Pílar Del Rio e o completou com o livro de Conversas Inéditas que também já li e postei aqui no Blog.

O filme me lembra muito Cadernos de Lanzarote escrito por Saramago, são detalhes da intimidade de ambos, seus pensamentos e a rotina de trabalho.



As idéias de Saramago, suas posições frente ao mundo. Um desiludido que sabia que a vida é o que ela é e o ser humano também, demasiado humano. Apesar de melancólico ele tem senso de humor.

Pílar é uma mulher forte, que abre mão de sua carreira de jornalista para assessorar Saramago, mas é uma escolha e o faz com prazer. E ele é dependente dela, a todo instante se ouve Saramago: Pílar! Pílar! Isto lhe dá um lugar que para outros poderia ser sufocante, mas é a beleza do amor que une os dois, um amor maduro entre dois seres que já haviam vivido antes outras experiências em suas vidas.



Havia um Saramago e havia um José, mas Pílar, era única.

Recomendo o documentário seguido do livro. Você encontra o filme completo no Youtube.


Miguel Gonçalves Mendes nasceu em 1978 em Covilhã, Portugal. 

FILME: NO LIMITE DO SILÊNCIO - 2001


Direção: Tom McLoughlin - 2001 
Duração: 109 min 
Título Original: The Unsaid 

O difícil de falar sobre este filme é não contar as revelações que surgem no decorrer do mesmo e assim não permitir o suspense a quem ainda não assistiu.

Michael Hunter (Andy Garcia)  um psiquiatra renomado que não consegue aceitar que seu filho adolescente Kyle (Trevor Blumas) se suicida deixando-o arrasado. Após o ocorrido Michael deixa de dar consultas e aulas, ele se fecha em si mesmo, tem seu casamento desfeito pois sua esposa Penny (Chelsea Field) o culpa pelo o que aconteceu, o que ele também sente achando que poderia ter evitado este desfecho trágico. A irmã de Kyle também se sente mal, pois foi no dia de sua apresentação onde todos se ausentaram para ir vê-la que o irmão que não quis ir comete o suicídio.

Três anos depois, uma ex-aluna de Michael, Barbara (Teri Polo) o procura e pede que examine um caso que está sob seus cuidados, é o de Thomas (Vincent Kartheiser) que sofreu uma tragédia familiar e agora está prestes a atingir a maioridade e obter sua liberdade de viver por conta própria, saindo do orfanato para onde foi encaminhado após seu pai haver matado sua mãe. Barbara sente que algo não está bem e que ele não está pronto para sair.

Inicialmente Michael reluta, mas acabara se envolvendo com o caso. Aos poucos todo o drama virá à tona, e Michael sofrerá uma transferência para Thomas em quem ele vê seu filho morto. É surpreendente o que fica oculto nas histórias e o que elas podem causar. A culpa que Michael sente se mostrará muito mais profunda do que o fato de não ter impedido o suicídio e a história de Thomas também é mais trágica do que se pensa.

Entre Michael  e o pai de Thomas , só existe uma única diferença, a sorte.

Um excelente filme.
Tom McLoughin nasceu em 1950 em Los Angeles, Califórnia, EUA 

LIVRO - LUZ ANTIGA - JOHN BANVILLE



Banville, John. Globo, 2013
Tradução: Sergio Flaksman
334 páginas
Título Original: Ancient light

Talvez por ter criado uma expectativa eu esperasse mais deste livro que mesmo assim tem seus méritos.

Alex é um ex-ator que aos sessenta e cinco anos se recorda de seu primeiro amor pela mãe de seu melhor amigo ao mesmo tempo que no presente é convidado para atuar em seu primeiro filme. Ele era um ator de teatro que abandonou após sofrer um branco de memória no palco.

A primeira paixão de um adolescente aos 15 anos e por uma mulher mais velha, a mãe de seu melhor amigo Billie. Algo bem edipiano, onde se confunde a mulher com a mãe. Por outro lado temos uma mulher que também tem uma castração mal resolvida e acaba se envolvendo com um garoto que poderia ser seu filho. Este suposto amor, já que fica bem nítido que ele não a ama, mas a si mesmo e à imagem que faz dela, onde ficam evidentes a onipotência infantil em relação à mãe que deve atender aos seus desejos e olhar apenas para ele e mais ninguém. Ele salta algo em sua formação, no desenvolvimento de sua sexualidade, lhe faltando a primeiro amor por uma outra adolescente, a descoberta conjunta do corpo um do outro ainda se formando e tudo que isto nos ensina e traz para nosso crescimento e desenvolvimento, tanto que Alex é um homem que tem um certo medo das mulheres e suas questões não se resolvem.

A sensação que tenho é que Alex nunca cresceu, amadureceu. Ele inventa seu mundo e cria os quadros imaginários que lhe convém. Ele mesmo nos diz no livro que não se pode fiar ao que pensa ou recorda. A memória é sempre uma representação do que nós pensamos ter visto e onde nos fixamos, ela nos engana, tece um romance e nada garante que é o que realmente aconteceu, mas é o que pensamos ter acontecido. Quantas vezes ao contar uma história para outro que também participou ouviremos que não foi assim, que alguém não estava lá e temos certeza de que estava?  A cada um sua versão.

Alex se fixa apenas no que lhe interessa em relação a Sra. Gray, ele nunca a ouve, não se preocupa com o que pode lhe ocorrer desde que ele se sinta seguro e a tenha. O final desta história apenas mostra o quanto ele estava distante da realidade e a imaginou. Nunca havia percebido que ela poderia estar doente e criou todo um final onde teríamos um escândalo que não deixaria de envaidecê-lo, uma vez que o garoto havia conquistado uma mulher como ela. Também fica evidente que apesar de tudo há o medo que paralisa e a consciência de que era algo que não era correto e que seria reprovado por sua mãe, pela sociedade e pelo padre. O estranho é que ninguém diz nada, o que pode ser um alívio mas também uma frustração para aquele ego tão centrado em si mesmo.

Lydia, sua esposa, é tão distante quanto sua mãe foi no começo da história. A atriz com quem contracena Dawn Devonport tenta o suicídio como sua filha que morreu assim. E apesar de haver na orelha do livro a informação de que ele estaria vivendo o personagem que estava com sua filha quando esta se suicidou, nada o comprova no livro, e podemos ficar com a opção que ele novamente estava criando um mundo para si, como se tentasse reparar sua falta de presença como pai e a crença de que poderia ter evitado este desfecho, uma onipotência que se revela novamente.

No fim o que rege sua vida é o medo, a insegurança que o faz buscar o colo de uma mulher, de uma mãe.


John Banville nasceu em 1945 em Wexford na Irlanda.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

FILME: AMÉLIA - 1999



Direção: Ana Carolina - 1999 
Duração: 130 min 
Roteiro: Ana Carolina e José Antônio Pinheiro
País: Brasil 

Uma ficção sobre Sara Bernhardt ao Brasil em 1905. Sara (Beatrice Agenin) é convencida por sua camareira Amélia (Marília Pera) a vir passar uma temporada no Brasil, porém ao chegar aqui Amélia morre de febre.
Sara se vê então num país que considera exótico e selvagem sem sua camareira que fala a língua, em plena crise existencial e artística e terá que se haver com as duas irmãs de Amélia e uma afilhada que vão para o Rio encontrar Amélia para resolver a questão das terras em Minas onde elas vivem.



São três mulheres simples, sempre viveram no campo, no interior e não entendem nada de arte e não falam nem uma palavra de francês. Elas diante do fato da morte de Amélia ficam por ali como costureiras de Amélia, e teremos cenas cômicas com as três se adaptando à um Hotel, onde pretendem cozinhar e levar a vida como sempre fizeram.



Obviamente não há maior disparidade do que entre estas três e Sara, e ela fica horrorizada, não se acostuma ao Brasil, seus cheiros, sons, seus costumes. Aos poucos vão se comunicando, sabe se lá como conseguem, mas o fazem, mas isto não diminuiu as diferenças neste contraste tão forte.



Apesar de Sara vir do dito mundo civilizado e as três mulheres representarem nosso mundo caipira, é Francisca (Miriam Muniz) que dará um show recitando I-Juca Pirama em uma cena belíssima.


Ana Carolina nasceu em 1943 em São Paulo - SP.