domingo, 1 de junho de 2014

DOCUMENTÁRIO: OS CADERNOS SECRETOS DE NUREMBERG - 2006



Direção: Jean-Charles Deniau - 2006 
Duração: 52 min 

Baseado nos cadernos de Leon Goldensohn 

Leon Goldensohn foi o psiquiatra americano que acompanhou os criminosos nazistas durante o julgamento de Nuremberg. Ele tinha na época 34 anos e era judeu. Visitava diariamente os presos e conseguiu que falassem. O Documentário relata as entrevistas realizadas com Hermann Göring, Rudolf Höss, Hans Frank e Julius Streicher possibilitando pela primeira vez uma visão do psiquismo e da mente destes criminosos.

Quando o julgamento terminou Goldensohn voltou para a América, após sua morte sua esposa não se deu conta da importância destas anotações e os cadernos se dispersaram sendo recuperados novamente somente em 2004 quando vieram à luz. A Companhia das letras editou o livro com as entrevistas.

É impressionante a constatação de que não há culpa nem arrependimento. Como pode? A primeira questão é que não podemos olhar para estes criminosos como monstros com problemas mentais, loucos, mas sim, como um ser humano como todos nós somos. Eles não são uma aberração fora de tudo, pelo contrário, o mais chocante e preocupante é que são pessoas como as outras, e isto nos leva a pensar que não basta eliminar estes e descobrir quais são as características do monstro para que não haja repetição da barbárie, isto pode se repetir a qualquer momento em qualquer lugar.

Mas a compreensão do que leva um ser humano comum a agir desta forma é o que pode mudar algo e ajudar a evitar repetições.

Como é possível que um povo que vem da terra de Goethe, Nietzsche, Schopenhauer, Thomas Mann entre tantos outros, grandes músicos, filósofos, escritores, cientistas, produziram esta monstruosidade?

Todos eram bons pais, maridos, vinham de famílias comuns, alguns tinham nível superior, e todos fizeram o teste de QI e foram considerados de inteligência superior. Então como foi possível? Como é possível que um  homem ou mulher seja um ser amoroso com sua família, filhos e se transforme num monstro cruel, assassino com outros?

Poderia se falar em esquizofrenia? Não é o caso deles. Todos nós temos o bom e o mau dentro de si mesmo e há sempre um gatilho para detonar este lado cruel, mau, mas o casos destes criminosos parece ainda ser mais complexo, a impressão que se tem é que eles aboliram a fronteira entre o bem e o mal. Não é uma questão de ter os dois e eles atuarem em algum momento conforme o contexto, mas sim, uma simultaneidade dos dois, não há fronteira dividindo, estão juntos atuando ao mesmo tempo. Estamos acostumados a pensar em opostos, mas ali é o simultâneo.

Um outro ponto que chama muito a atenção é a obediência cega e a necessidade do ideal de perfeição. Era uma necessidade eliminar os judeus e temos que fazê-lo de forma eficaz, era meu trabalho. Como pode um pai que chega em casa e abraça, brinca com seus filhos, mandar crianças para a morte? Era seu trabalho e precisava ser bem feito.

Não há moral neste trabalho, não há perguntas, simplesmente se cumpre a ordem e se fica satisfeito se foi eficaz. Como pode um ser humano chegar a isto? Eles eram funcionais com um supereu que ditava o ideal de perfeição sem moral, sem perguntas, faça e bem feito. Por outro lado eram egocêntricos, como Göring, vaidoso, narciso, que a tudo transformava num espetáculo para se promover, inclusive o julgamento.

Os outros são levados a agradar ao líder, desejam seu reconhecimento, desejam o elogio, como qualquer criança o faz em relação ao seu pai, ou sua mãe. Hitler era um pai.

O anti-semitismo não foi criado pelo nazismo, sua história retorna ao passado. Todo outro é um estranho, assusta, se transforma num bode expiatório para todos os males que afligem. Sempre há a tendência de expulsar o estranho, segregá-lo. A grande dificuldade de conviver com o diferente que leva  ao desprezo do outro, condenando sua cultura e modo de ser.

Os nazistas se consideravam puros, uma raça superior, queriam purificar o território deles incluindo os conquistados. Formados numa obediência servil, disciplina, humilhados pela perda da Primeira Guerra, o sistema patriarcal desmoronado, e desejando agradar ao imenso pai que os salvava, lhes restituía a honra, o lugar, eles não sentem culpa pelo o que fizeram, pelo contrário, acreditam que estavam certos.

O que se percebe ao longo das entrevistas é a racionalização do crime. Obviamente que os presos também tinham em mente salvar suas vidas, mas é notório  a falta de remorso ou culpa, a alegação de que cumpriam ordens, e que eles pessoalmente nunca assassinaram ninguém, eram outros que faziam isto, mas eles assinaram as ordens. Muitos alegavam que não sabiam do que acontecia, que não sabiam do extermínio. Ainda hoje há pessoas que alegam que tudo isto foi uma invenção dos que venceram a guerra. A força da negação que chega ao delírio.



Leon Goldensohn 

Jean-Charles Deniau é francês

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