quinta-feira, 13 de março de 2014

FILME: A PELE QUE HABITO - 2011


Direção: Pedro Almodóvar - 2011 
Duração: 120 min
Título original: La piel que habito 
Roteiro: Pedro Almodóvar e Agustín Almodóvar 
País: Espanha 

Baseado no romance Mygale, renomeado como Tarântula de Thierry Jonquet e uma homenagem à escultora Louise Bourgeois. 

Ganhou o Bafta 2012 como melhor filme estrangeiro e o Prêmio da Juventude em Cannes 2011 


O filme retrata a situação limite refletida em dois personagens - Dr. Robert Ledgard (Antonio Banderas) e Vicente (Jan Cornet)/ Vera (Elena Anaya).

Robert é um reconhecido cirurgião obcecado por encontrar a pele  que resiste ao fogo, picadas de insetos, a tudo que possa vir do exterior. Apesar de alertado pelo diretor do Hospital sobre ser anti-ético o que estava fazendo ele persistirá. Esta busca se explica inicialmente por sua esposa haver sofrido um acidente de carro onde ficou com o corpo totalmente queimado, e mesmo com todas suas tentativas de salvá-la, ela acaba se suicidando. Ele dirá numa conferência que a pessoa precisa de um rosto.

Robert continuará com suas experiências, e em sua casa vive Vera que usa uma segunda pele e lhe serve de cobaia para suas experiências com peles que obtém através de métodos transgênicos e com sangue animal. Há também Marília, sua fiel empregada (Marisa Paredes) que cuida de Vera, mas percebe-se que esta está presa ali.



O filme inicia em 2012, mas retornará ao passado para que possamos compreender o que o levou a esta obsessão. Robert é filho de Matilde com um homem rico que o adotou pois sua esposa era estéril, mas ela também teve um outro filho com um empregado da casa que é chamado de Tigre. Uma mulher fria, distante, que cuida do bem estar do filho, mas não é amorosa. Tigre por sua vez cresceu nas ruas, como um animal abandonado, sem lar. Gal a esposa de Robert se apaixonará pelo meio-irmão de Robert e fugirão juntos, justamente quando ocorrerá o acidente com o carro se incendiando.

Robert e Gal tem uma filha, Norma (Blanca Suárez). Ao ouvir sua filha cantando Gal irá até a janela e então verá seu reflexo no vidro da janela e não suportando o que viu se suicida jogando-se pela janela e caindo em frente à sua filha que se traumatiza e passa a sofrer de fobia social.
Numa festa Norma começa a olhar um rapaz e acabam saindo para o jardim. Ela quebra o salto de seu sapato e o retira, também a blusa dizendo que não suporta roupas, ou talvez, a pele que habita, e isto instiga o rapaz a avançar. Fica  uma incógnita se ele efetivamente a estuprou, pois ele para quando ela começa a gritar Não! dá-lhe um tapa para fazê-la parar e foge. Seu pai a encontra e ela está desmaiada, porém ao acordar ela vê no pai o agressor.

Ela será internada, não suporta mais ver o pai, e acabará se matando, repetindo a mãe. Seu pai que viu o agressor fugindo irá atrás dele e o capturará, e como vingança o transformará na cobaia para seus experimentos, inicialmente com uma vaginoplastia, e o transformará em Vera, a mulher ideal, aquela que não o abandonará, que terá uma pele resistente à tudo.



Até aqui o que vemos é o lado limite de Robert. Um filho que não teve o amor, o contato da pele de sua mãe, e que perdeu suas mulheres. Primeiro a esposa para seu meio-irmão e depois ela e a filha pelo suicídio. Ele busca esta mãe que lhe falta, ele deseja uma mulher idealizada que não o abandonará, que resistirá a tudo. Por outro lado, ele não soube reagir as supostas ofensas, não se libertou da mãe e do desejo de ser amado por ela, não se vingou do meio-irmão e da esposa, não necessariamente em ato, mas no simbólico, mas ao contrário, ele tenta salvá-la e ficar com ela que novamente o abandona. E sua filha é a repetição de tudo isto, ela também o deixa.

Quando Tigre retorna ele estuprará Vera, mas desta vez quando Robert chega, ele o matará, vingando-se deste primeiro que lhe tomou a mulher e que ele não aceitou perder. Por outro lado Tigre tenta se apoderar do que supõe ser seu direito, do que poderia ser seu, se não tivesse sido abandonado pela mãe, e se vinga do meio-irmão conquistando sua mulher.

De outro lado temos Vicente, que tem uma mãe amorosa, que está apaixonado por Cristina que é homossexual e o rejeita como homem. Ele é sequestrado por Robert e se vê transformado num objeto, no objeto de gozo e desejo do cirurgião. Aqui temos o outro estado limite, como lidar com esta pele que habito mas que não é a minha, que não tem referências, que não tem marcas, ou seja, transformado num organismo, e não mais em um corpo. Uma pele fina totalmente resistente, um corpo de mulher. A primeira coisa que ele faz é tentar passar ao ato, fugir, se matar. Não consegue. Então ele começa através da Yoga a buscar dentro de si o que é, e usando restos de tecidos dos vestidos de Gal, com linha e costura ela vai esculpindo algo, através da escrita na parede ele tenta se reconstituir. Aqui a referência à Bourgeois, com seus morcelés, o corpo fragmentado.



Resta-lhe o agressor, a única coisa que lhe resta e ele se entrega ao gozo deste outro. Nas cenas finais, quando ele vê no jornal sua foto e a informação que sua mãe nunca desistiu de encontrá-lo, algo se reconstitui deste antigo Outro, e é o momento que ele para se livrar do carrasco e de ser objeto, ele mata.

Retorna para sua casa, Cristina é a primeira a saber o que lhe ocorreu. Ele usa o vestido que desejou ver Cristina usando e que ela por ser homossexual lhe disse para que vestisse, agora ele o veste, ela veste. Fica a pergunta, será que agora ele/ela poderá estar no lugar do desejo de Cristina?. E sua mãe, o aceitará como mulher? Fica a incógnita que Almodóvar nos deixa.

A presença da referência à Louise Bourgeois é belíssima e muito bem elaborada no filme, uma vez que a artista sempre trabalhou seu inconsciente e tudo que lhe era de dentro em suas obras, a dor, a frustração, o amor, o ódio, seus agressores internos, sua identificação, através do corpo que se expressa na arte. Bourgeois sentia o cruel e o trágico da existência humana.



Pedro Almodóvar

Música de Alberto Iglesias

Alberto Iglesias nasceu em 1955 em San Sebastián, Espanha. 

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